Sei o que faço quando te peço para olhar para mim. Sei-o tão bem quanto anseio pelo efeito que colho cá dentro. Hipnose. É um poder demasiado intenso para nos conseguirmos desviar e envolve-nos num nevoeiro que obriga a razão a semicerrar os olhos. É assim que te prendo a mim. É assim que nos perdemos um no outro. É desta maneira que a tua essência derruba as minhas defesas. A ausência de barreiras é o nosso ponto de encontro.
Até que um de nós abra os olhos ao sonho, a realidade é apenas esta: tu e eu. E se nenhum de nós teimar em afogar-se no pensamento eu sou tua e tu és meu. Uma pertença livre em vontade e gravada a ferros por desejo.
Aqui, e só aqui eu me admito quebrável e tu te fazes herói de banda desenhada. Eu deixo, tu gostas. E deliramos. A minha fragilidade perante ti é uma armadilha em que te deitas de bom grado. É do sangue desta nossa guerra declarada por paixão que nos alimentamos e nos mantemos de pé, de frente um para o outro. É neste desafio impossível que nos matamos bem devagar, porque é desse engano de alma ledo e cego que eu e tu existimos em dimensão paralela. Neste olhar de fogo cruzado na calma da madrugada uma palavra em qualquer das frentes é o termo das duas. Medo? O sorriso que esboçamos fielmente um ao outro assustou esse desertor e deixou-nos finalmente a sós na pureza, que é o nosso descampado combinado. Pronto para o golpe final?
Aqui estamos nós, presos no olhar um do outro. Os meus olhos de veneno e os teus de escuridão. É esta condição de perigo que se dissolve nas línguas como algodão doce. Como é que poderia ser mau se sabe tão bem?